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The Banner Saga

The Banner Saga - Uma Jornada Estoica

Um dos fundadores da Stoic fala da arte, das escolhas e das influências que resultaram num dos RPG mais belos dos últimos tempos.

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Há cerca de dois anos, Alex Thomas, Arnie Jorgensen e John Watson - os fundadores da produtora Stoic - deixaram a segurança e o conforto da Bioware para tentarem a sua sorte de forma independente, com o objetivo de criarem o jogo que sempre desejaram fazer.

Graças a uma campanha de financiamento bem sucedida no Kickstarter, e vários apoios que angariaram para o projeto, conseguiram realizar a sua visão. The Banner Saga é o resultado de todo o trabalho, um RPG elegante com escolhas complicadas e diálogo subtil, tudo embrulhado num estilo visual fabuloso e um sistema de combate inteligente (se querem ler mais sobre o jogo em si podem espreitar a análise do Gamereactor para mais detalhes).

Depois do lançamento, a 13 de janeiro, reunimos-nos com Alex Thomas, que partilhou vários pormenores sobre a criação do jogo, as ideias e as influências que o moldaram e quais são os planos do estúdio para o futuro.

The Banner Saga é um jogo que se destaca de imediato pelo estilo visual, por isso decidimos começar por aí, e pelas principais inspirações. "Depende de onde a pergunta vem," afirma Thoma. "Já ouvimos todo o tipo de respostas: Don Bluth, Ralph Baskshi, pintores russos... A verdade é que a maior parte foi inspirada pelo trabalho de Eyvind Earle, um artista americano que também foi o diretor de arte da Bela Adormecida da Disney. Se olharem para as obras pessoais de Earle, podem notar algumas semelhanças, e até podem reparar nas influências que teve com outros jogos. Por exemplo, Super Brother Sword and Sworcery também foi inspirado por ele, e esse jogo foi também uma grande inspiração para tentarmos a nossa sorte como produtores independentes."

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O jogo alterna entre retratos das personagens, paisagens e batalhas por turnos. "Tudo foi difícil e demorou muito tempo. Fomos muito ambiciosos e desafiámo-nos constantemente," afirmou Thomas em relação à criação da arte. "Tivemos um artista (Arnie Jorgensen, um dos fundadores da Stoic) que fez praticamente todos os materiais de arte não-animados. Quanto às animações, tiveram o seu próprio processo incaracterístico: basicamente recriámos todas as animações no nosso quintal e filmámos tudo a partir de uma escada. Depois separámos tudo frame a frame e enviámos para um estúdio de animação local chamado Powerhouse Animation, que tem mais recursos para produzir esse tipo de animações."

Algo que adorámos em relação a The Banner Saga, mas que talvez não seja imediatamente óbvio, é o design do mapa. Perguntámos como foi a sua criação: "Perdemos muito mais tempo com o mapa do que qualquer um de nós pretendia, sobretudo porque gostámos bastante do processo."

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"O mapa atravessou várias iterações visuais, de forma a certificarmo-nos de que funcionaria no contexto da história. Movemos localizações e marcos de um lado para o outro constantemente, até que as distâncias parecessem certas, já que a distância é um elemento muito importante do jogo em si. Depois disso atravessámos um processo bastante exaustivo em colaboração com um escandinavo nativo, para nos assegurarmos que os nomes dos locais não eram uma perfeita idiotice. É como um pequeno bónus para quem conhecer o idioma."

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Alex Thomas continuou: "Por último, decidimos já bem tarde no processo de produção, que devíamos deixar o jogador descobrir mais sobre cada localização no mundo, seja importante para a história, ou não. Foi já bastante próximo do fim da produção e eu passei umas boas 15 horas seguidas a escrever essas descrições. Mais para o fim estava a começar a ser difícil descrever gelo e florestas de novas maneiras. Nos próximos jogos poderão visitar muitas destas localizações."

A influência da mitologia nórdica pode ser sentida por todo o jogo, não apenas no mapa, por isso perguntámos se esse sempre foi o plano da produtora ou se foi algo que surgiu mais tarde. "Essa foi uma base muito sólida para nós," respondeu-nos. "A melhor coisa em relação à mitologia nórdica é que a maior parte é realmente interessante e inexplorada. Quantas vezes ouviram os mesmos mitos nórdicos sobre martelos e relâmpagos? Mas nunca ninguém fala das Normas, as três mulheres sábias que vivam além do tempo e que determinam o destino de cada pessoa. Outro exemplo é o Ratatosk, um esquilo que subia e descia a Árvore Mundo [Yggdrasil], provocando o dragão que dormia perto das raízes. Isto é que é o material interessante e criativo."

"O nosso conceito de design para tudo neste jogo esteve focado em levar o género de fantasia numa direção atípica," continuou. "Já estávamos cansados de Orcs, Goblins e Anões. A mitologia nórdica foi realmente um excelente ponto de partida para nós, porque é estranha e algo desconhecida. Toda a gente fala de Thor e Odin, quando o que é realmente interessante são as histórias sobre o sol ser comido por lobos gigantes ou quando tiraram uma serpente do tamanho do mundo do oceano com um gancho."

Também interessante são os Dredge, o inimigo calado que persegue o jogador durante a campanha. O co-fundador da Stoic explicou as motivações que levaram ao seu design, e divulgou as suas inspirações. "Os Dredge não são diferente dos nórdicos Dvergr, que podiam criar objetos mágicos e eram eles próprios feitos de pedra. Em vez de serem pequenos, preferimos criá-los de forma imponente, gigantes silenciosos que não são sedentos de sangue. Um pouco como as criaturas de Shadow of the Colossus, não se sabe muito bem o que são ou as suas motivações."

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Afastando-nos da arte e do design, questionámos se cortaram alguma função do jogo durante a produção: "Acreditem ou não, não cortámos praticamente nada deste jogo. Aliás, diria que acrescentámos mais conteúdo do que esperávamos. Isso deveu-se sobretudo ao financiamento que conseguimos através do Kickstarter, mas também ao compromisso de demorar o tempo que fosse necessário, queimando as nossas poupanças pessoais no processo. Se existe algo que gostaria de ter incluído, seria um pouco mais de movimento nas cutscenes. Num mundo perfeito também teríamos vozes para todas as personagens, mas isso teria sido uma tarefa massiva e dispendiosa para um projeto desta natureza, devido à quantidade de diálogo que existe em The Banner Saga."

O Kickstarter deu uma grande injeção financeira e popularidade ao projeto, permitindo que o estúdio conseguisse polir o produto final antes do lançamento. Quisemos saber o que sentiram quando pediram financiamento às massas e se isso mudou alguma coisa no jogo.

"Penso que olhámos para tudo o que era bom e mau [em relação ao Kickstarter] em igual medida. O maior problema é que ninguém sabia o que esperar de situações como atrasos e iterações, sobretudo porque tinham sido investimentos pessoais. Nós incluídos. O Kickstarter ainda precisou de algum tempo para amadurecer e que as pessoas que o usam pudessem aprender melhor o que esperar. Enfrentámos muita oposição em alguns aspetos, mas mantivemos-nos fiéis ao que acreditamos e penso que entregamos o melhor que conseguíamos, e penso que no fundo era isso que as pessoas queriam. Mas foi uma estrada difícil e às vezes assustadora de atravessar."

Factions é a componente multijogador competitiva de The Banner Saga e foi libertada no ano passado, como um título free-to-play. Thomas explicou o processo de adaptar a experiência para um só jogador. "Factions foi muito importante para nós, porque nos ajudou a identificar os pontos do combate que necessitavam de ser melhorados. Por exemplo, adicionámos um sistema chamado "Pillage Mode", que entra em ação quando um inimigo só tem uma criatura de pé. Por uma série de razões, isto foi fundamental para equilibrar o combate e adicionou uma camada interessante de estratégia. Existiram várias revisões deste género e centenas de outros ajustes mais pequenos, porque na realidade existiam muitos jogadores a jogar Factions que nos deram feedback."

Quanto à inteligência artificial, John Watson, o nosso diretor técnico, foi capaz de determinar como as pessoas jogavam e assim moldar a IA para um comportamento credível, enquanto permite espaço para se ajustar com a dificuldade. Basicamente, os americanos dizem que é um pouco difícil de mais e os europeus dizem é que maravilhosamente desafiante."

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E o que reserva o futuro a Factions? "Ainda temos alguns objetivos para cumprir, e queremos tornar Factions mais num jogo e menos numa demo. Penso que o vamos fazer eventualmente. Não é algo que seja necessário fazer de uma só vez."

Um elemento que mal abordámos sobre o jogo foi a fantástica banda sonora. A nossa única crítica talvez seja o facto de que é curta. Austin Wintory, o compositor que trabalhou em Journey e Monaco: What's Yours is Mine, produziu a banda sonora e a Stoic apreciou bastante o trabalho conjunto.

"Quando a campanha no Kickstarter estava a todo o gás, contactámos o Austin quase que por impulso. Nem esperávamos que respondesse. Os três tínhamos acabado de jogar Journey e ficámos boquiabertos com a banda sonora. Austin tornou-se de imediato a nossa primeira escolha como compositor. Para nossa surpresa, contactou-nos nesse mesmo dia e tivemos uma longa conversa pelo telefone. No fim da semana já tínhamos um contrato de trabalho assinado. Toda a experiência foi incrível, e teve tanto a dizer sobre a direção do jogo como qualquer um de nós. Nós dizemos que é um membro honorário da Stoic."

A situação parece estar bem encaminhada para a Stoic, mas como quais terão sido as circunstancias que levaram à saída da Bioware e que permitiram formar a produtora?

"Com Star Wars: The Old Republic estável, estávamos satisfeitos com o nosso desempenho nesse projeto, mas também sentíamos que era a hora de fazermos algo independentes, ou nunca o faríamos. Eu e o Arnie já tínhamos trabalhado num pequeno projeto chamado Dino Boy, que era um livro de crianças para iOS, mas tínhamos aspirações e fazer algo maior. John juntou-se a nós para reforçar o lado técnico da produtora. Formámos a Stoic no início de 2013 e em poucas semanas já tínhamos o conceito da jogabilidade produzido e estávamos muito confiantes sobre a direção que íamos tomar."

Um ano depois, será que Thomas sente falta de trabalhar num ambiente de um grande estúdio? "Não tinha qualquer reserva sobre a experiência que tive a trabalhar para uma grande companhia. O que aprendi lá é inqualificável e a grande vantagem é que estávamos rodeados de peritos de todas as áreas. Tudo o que sempre quiseram saber sobre fazer jogos e as ferramentas para o fazer estavam à mão de semear. Mas tudo acaba por se resumir à vontade de trabalhar por mim e usar as minhas habilidades para criar o jogo que eu sempre quis fazer. A nossa vantagem, como um estúdio pequeno é que, ao contrário das grandes produtoras, somos ágeis. Podemos tomar decisões rapidamente e redefinir o curso instantaneamente, se for necessário."

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Essa agilidade não é algo que a Stoic queira perder, mesmo que isso signifique que existem opções que têm obrigatoriamente de ficar de fora. Ficámos curiosos para saber se eventualmente ponderariam fazer a sequela com mais vozes: "Depende. Não é só o fator financeiro que está em causa, é também o facto de interferir com o ciclo de produção. Uma das nossas maiores vantagens é conseguirmos mudar as coisas no momento e redefinir tudo constantemente. Na Bioware apercebemo-nos de como as vozes podem prender as produtoras: não podemos mudar um diálogo que já foi gravado pelo ator. E além disso e do aspeto financeiro, existe o tempo necessário, que é considerável."

Quanto às decisões do jogador durante a aventura, Thomas assegurou-nos que serão transportadas para a sequela: "As decisões dos jogadores foram algo muito importante para este primeiro jogo, e existem várias situações que serão transportadas para as sequelas; algumas óbvias, outras nem por isso. A história da humanidade e dos Varl continua onde acabou no primeiro jogo."

Agora que o jogo está no mercado, qual é o plano do estúdio a curto e longo prazo? "Para já, vamos descansar. No período final de produção estávamos a trabalhar 15 horas diárias, às vezes mais, e estamos exaustos. Desde o lançamento que estamos a ler as análises, o feedback bom e crítico, e vamos trabalhar numa atualização antes de fecharmos o estúdio por duas semanas. Quando regressármos, voltamos a trabalhar em Banner Saga. Já estou cheio de ideias que tenho de afastar, senão não consigo relaxar. Com a base já feita, acreditámos que será um pouco mais fácil daqui para a frente."

"O nosso plano a longo prazo passa por continuar a melhorar Factions e terminar a trilogia. Depois disso... quem sabe?"

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Se existe uma palavra que descreve quase todas as facetas de The Banner Saga, é 'elegância'.



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