Gostámos imenso de Shadow of Mordor quando foi lançado em 2014. Não era um jogo brilhante, mas o inovador sistema Nemesis acrescentou algo de muito cativante ao género de ação e aventura, algo que nos pareceu realmente original. É um sistema dinâmico que nomeia Orcs em várias posições dos exércitos, torna-os inimigos diretos do jogador, e acrescenta um toque muito pessoal ao jogo. Em Shadow of War o sistema Nemesis regressa bastante expandido e com maior variedade.
Antes de continuarmos a falar do sistema Nemesis, devemos olhar para o que é Shadow of War. Esta é a continuação direta de Shadow of Mordor, e arranca onde o antecessor terminou. O falecido protagonista Talion continua entre os vivos graças à sua união com o espírito de Celebrimbor, o elfo que criou os anéis de poder para Sauron. É uma estória que se passa antes do início de O Senhor dos Anéis: A Irmandade do Anel, e que neste caso vê Celebrimbor criar um novo anel do poder. O objetivo é usar o anel para derrotar Sauron, mas esse anel é imediatamente perdido para Shelob (surge na trilogia dos filmes em forma de aranha gigante) no prelúdio da aventura. É a desculpa para que o jogador perca os seus poderes, e basicamente tenha de começar tudo de novo. Este ato inicial é francamente fraco, e durante algo como 10 horas, vão estar a matar Orcs indiscriminadamente, a aprender sistema de jogo, e a evoluir Talion. Shadow of War foi uma experiência desapontante durante este primeiro ato.
O jogo tem uma estrutura confusa, sobretudo nas horas iniciais, onde vão estar a resolver uma série de missões secundárias sem grande impacto, enquanto que a estória em si demora bastante tempo a arrancar. Ainda assim, gostámos da variedade de missões que encontrámos, mesmo que algumas exagerem no objetivo para seguir outras personagens. Ao longo do caminho vão descobrindo estórias paralelas, algumas mais interessantes que a própria narrativa principal, e gostámos particularmente de conhecer as personagens Bruz e Ratbag, que aparecia no primeiro jogo. É um contraste positivo ao que é uma estória algo aborrecida, embora o final do jogo nos tenha impressionado com algumas surpresas.
Shadow of War é um jogo muito maior que o primeiro, e em vez de dois pequenos mapas, desta vez vão visitar cinco pequenos mapas. Pequenos no sentido em que são mundos abertos, mas numa escala reduzida quando comparado com Assassin's Creed, por exemplo. Parece-nos uma boa estratégia, a de dividir o mundo em cinco áreas, em vez de as colar num grande bolo. Desta forma o jogo consegue aproveitar o sistema Nemesis com outra eficácia. Como no anterior, vão criar rivalidades com alguns Orcs, que ao avançarem pelas fileiras do inimigo, vão começar a ter mais impacto no jogo. Estes inimigos poderosos podem surgir a qualquer momento, mesmo quando estão a lutar com outros oponentes, mas não acontece de forma frequente, o que torna estes encontros especiais. Dito isto, os mapas de Shadow of War não são muito inspirados. Esperem muitos tons de cinzento e castanho, sem grande variedade, algo que se torna ainda mais cansativo devido a algumas texturas medíocres. Já agora, vale a pena referir que jogámos a versão PS4 Pro numa TV 4K com HDR.
Com um mundo aberto vem a navegação, que à semelhança do primeiro jogo, é problemática. Pressionado num botão vão correr, trepar paredes, e saltar, à semelhança do que acontece em Assassin's Creed. O facto de ser o mesmo botão para correr, trepar, e rebolar, apenas atrapalha as ações do jogador, e o jogo raramente adivinha para onde o jogador quer saltar. Neste aspeto, está vários furos abaixo de Assassin's Creed, que si só também não é perfeito.
O sistema de combate tem grande profundidade, sobretudo quando começam a desbloquear várias habilidades, mas vive mais de reação do que ação. Contra-ataques, desvios, cambalhotas, atordoamentos - tem de saber reagir adequadamente aos inimigos. Gostámos do combate, ainda que não seja tão recompensador quanto Batman Arkham, por exemplo.
Mais uma vez voltamos ao sistema Nemesis, que é novamente a grande estrela de Shadow of War, à semelhança do jogo anterior. Inicialmente vai parecer muito parecido com o antecessor, mas com o avançar das horas vão desbloquear novas mecânicas e conhecer diferentes tipos de Orcs, e a evolução do sistema vai tornar-se mais evidente. Cada Orc do sistema Nemesis tem características próprias, que devem descobrir ao encontrarem documentos, ou ao interrogarem outros Orcs. Alguns são resistentes a contra-ataques, mas temem fogo. Outros sofrem imenso dano de ataques críticos, mas resistem a ataques furtivos, e assim por diante. Conseguir explorar a fraqueza de um Orc do sistema Nemesis é bastante motivador, tal como o é conseguir que um Orc fraco conseguia derrotar outro mais forte, tudo porque souberam aproveitar as vantagens do Orc mais fraco.
Existem mais tipos de missões para o sistema Nemesis, mais formas de manipular os inimigos, e também mais formas de os humilhar. São os ingredientes perfeitos para criar situações únicas e fantásticas, como este exemplo. A certo ponto estávamos a enfrentar um capitão de nível alto, com a ajuda de um dos nossos seguidores, mas o capitão teve a ajuda de um Orc que estava relacionado com o nosso ajudante, e isso levou o nosso companheiro a trair-nos. Foi uma situação espontânea que gerou caos glorioso. As vinganças online também estão de volta, e oferecem boas recompensas se decidirem vingar um jogador amigo.
Um lado de Shadow of Mordor que esta sequela expande imenso é o sistema de progressão da personagem e de equipamento. Existe uma árvore de habilidades para irem percorrendo, e se inicialmente vão ganhar muitas ações importante, mais tarde serve sobretudo para acrescentar variedade. O equipamento também expandiu tremendamente, com peças de vários tipos de qualidade e raridade, incluindo gemas que acrescentam vantagens ao equipamento. É um sistema muito mais expansivo e complexo.
Uma das maiores novidades é a introdução dos Sieges, que ligam ao sistema Nemesis. No papel são interessantes, e na prática funcionam, mas esperávamos mais variedade. Para dizer a verdade, gostámos mais dos preparativos, da forma como orientámos os exércitos, do que os próprios Sieges. Em cada um destes assaltos aos fortes inimigos terão de invadir uma sala do trono, onde vão lutar com o líder do forte. Estas batalhas pareceram-nos exageradamente difíceis, não numa perspetiva de desafio, mas de pura injustiça. Nestes combates têm de lutar sozinhos, e sem acesso a ataques furtivos - são obrigados ao confronto direto e nas condições do adversário. Quando enfrentamos Overlords sem fraquezas, e com inimigos que não param de aparecer, mais do ser um desafio, estes combates tornam-se penosos. Por vezes também terão de defender os vossos fortes, mas aqui não têm de se preocupar com a secção na sala do torno. Se por acaso gostarem deste lado de Shadow of War, então fiquem a saber que uma boa fatia do conteúdo de alto nível envolve os Sieges, e nesse momento tendem a ser mais interessantes.
Shadow of War é um jogo massivo, com muito mais conteúdo que o antecessor. Gastámos mais de 40 horas para terminar a aventura, e deixámos ainda muito por fazer. Infelizmente, Shadow of War é mais um caso de um jogo que optou por quantidade em detrimento de qualidade, e existe uma oscilação grande ao nível da qualidade do conteúdo. Vão lutar contra Balrogs, voar em dragões, e enfrentar espíritos, mas todas estas experiências acabam por ser desapontantes devido a restrições de design. Voar nos dragões, por exemplo, acaba por ser uma experiência limitada por 'paredes invisíveis' que restringem o movimento do dragão, enquanto que os espíritos são imunes a quase todas as habilidades, o que obriga a contra-atacar constantemente. Seria preferível menos conteúdo, mas mais trabalhado e variado.
No elemento técnico também ficámos algo desiludios com Shadow of War. Existem momentos em que o jogo oferece algumas vistas impressionantes ao jogador, mas uma boa fatia dos cenários são desinspirados e as texturas de má qualidade. Está longe de ser graficamente o jogo mais belo que já vimos, ainda que os fãs possam apreciar algumas das influências de Tolkien e Peter Jackson. Mais interessantes são os designs das tribos de orcs, que acrescentam grande personalidade a uma raça que nos filmes é perfeitamente banal e repetitiva. O som, embora não seja brilhante, cumpre o seu papel, e as vozes dos atores raramente se tornaram repetitivas ou aborrecidas (apenas as queixas de Celebrimbor deixaram de ter piada). Também vale a pena referir as definições da interface. O ecrã está recheado de informação, mas a certo ponto, essa informação torna-se irrelevante. Visitem as opções e limpem a interface da 'tralha' que está a mais, para uma experiência mas apreciável.
Não podemos terminar sem mencionarmos o controverso sistema de caixas de loot. Este é um sistema que começa a ser comum em jogos online: recebem ou compram um caixote e ganham conteúdo aleatório. Neste caso o conteúdo surge na forma de equipamento, e Orcs para o vosso exército, com vários graus de raridade. O problema é que estamos a falar de uma campanha de estória, e não de um modo online criado para esse efeito. Imaginem algo como Ultimate Team de FIFA, e agora pensem como seria se em vez de contratarem jogadores no modo Carreira de FIFA, tivessem de comprar pacotes de cartas como em Ultimate Team. Seria trágico, e até certo ponto, é isso que acontece aqui. É uma decisão de design óbvia para tirar proveito do jogador, e de quem quiser gastar dinheiro, uma decisão feita para servir a companhia e não o jogador. Utilizar caixas de loot numa experiência deste tipo é algo forçado, que não surge de forma natural, e isso entristece-nos, sobretudo porque não é o único a fazê-lo. O recém-lançado Forza Motorsport 7, por exemplo, cai no mesmo erro ganancioso.
Middle-earth: Shadow of War acaba por ser salvo pelo sistema Nemesis, que nos proporcionou os melhores momentos de jogo, mas sem ele seria um jogo de ação medícore. Existem momentos muito bons, mas também outros de qualidade bastante inferior. Shadow of War está longe de ser a sequela que gostaríamos, e se podemos ser francos, achamos que está na hora da Monolith criar algo baseado apenas no sistema Nemesis, e não numa licença como acontece neste caso.