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PlayStation VR: "O subconsciente pode ser enganado na Realidade Virtual"

Conversámos com Dave Ranyard, diretor da London Studios, durante a Lisboa Games Week.

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Dave Ranyard é o diretor dos London Studios da Sony Entertainment Europe, que nos últimos anos trabalharam de perto com o PlayStation VR. Dave marcou presença na Lisboa Games Week e falou com o Gamereactor sobre o potencial, as dificuldades e as particularidades do dispositivo de realidade virtual da PlayStation.

"O hardware é importante, mas o conteúdo é rei". Este tem sido uma espécie de lema da PlayStation ao longo dos anos. Até onde é que podem levar esta nova plataforma em termos de conteúdo inovador?

Acho que o aspecto mais fascinante da Realidade Virtual é a experiência que conseguimos dar aos jogadores. Existem coisas que até agora apenas era possível abordar ao de leve, mas existe uma mudança drástica no que toca a imersão. Se estiverem sentados em casa a jogar ou a ver um filme, têm uma televisão à frente que funciona como uma espécie de janela para outro mundo. E com frequência, é necessário criar empatia com as personagens, mesmo num jogo na primeira pessoa. Se pensarmos num filme ou num jogo mais narrativo, precisamos de adorar as personagens para nos preocupar-nos se elas morrem ou não. Com a Realidade Virtual nós somos a personagem. Em vez de estarem preocupados se a vossa personagem vai cair de um penhasco, são vocês que vão cair do penhasco (risos).

Logicamente que sabemos que estamos numa sala a jogar, mas o subconsciente pode ser enganado na Realidade Virtual. Aprendemos a tirar partido disso. Podemos mesmo tentar despoletar certas reações biológicas que o nosso corpo está programado para ter em determinadas situações.

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Se estivéssemos a ter esta conversa em Realidade Virtual, por exemplo, podia haver um abismo ao nosso lado. Apesar de ser perfeitamente seguro, o nosso cérebro iria começar a questionar ser era realmente seguro. Isso é suficiente para despoletar uma reação fisiológica. Ao termos noção disso, conseguimos colocar os jogadores em situações espantosas, onde podem ser atacados por um tubarão ou alguém lhes aponta uma arma à cabeça.

Aliás este é um excelente exemplo. Podemos estar a jogar um jogo onde a vossa personagem vai ser alvejada. Nada de anormal aqui em relação aos outros jogos. Mas em VR, se moverem a cabeça a arma segue o movimento. E os olhos do inimigo seguem os vossos olhos. Isto é, fundamentalmente, uma experiência mais imersiva.

PlayStation VR: "O subconsciente pode ser enganado na Realidade Virtual"

Significa isso que o VR pode estar condenada a oferecer, maioritariamente, experiências na primeira pessoa?

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Não necessariamente. É verdade que o nosso estúdio está mais focado em jogos na primeira pessoa. Mas é uma escolha porque é uma vertente que queremos explorar. Já experimentei muitas outras coisas na terceira pessoa que são igualmente excitantes. O meu jogo favorito de sempre é o Sonic The Hedgehog. Um clássico das plataformas 2D. Adoro jogos de plataformas. E ser como uma espécie de deus num mundo de plataformas pode ser uma grande experiência. Se virem o trabalho que o Nic Doucet tem feito no nosso estúdio do Japão, - foi ele que fez o PlayRoom da PS4 - ele tem as suas pequenas personagens robot que está a usar para a Realidade Virtual. Basta olhar para eles que reagem e agora imaginem poderem pegar-lhes...acho que é igualmente impressionante. Mas no London Studio estamos a focar-nos mais na primeira pessoa porque achamos que é uma experiência única.

Há três anos atrás, quando estávamos a decidir a nossa abordagem, o nosso director criativo George Andreas perguntou que tipo de emoções seria possível despertar através da Realidade Virtual. Obviamente que adrenalina, e funciona bastante bem. Mas o que mais para além disso? Foi isso que nos atraiu para o VR.

Já que estamos a falar de emoções, que tipo de impacto é que o VR pode vir a ter, realmente, nas indústrias de entretenimento? E não nos estamos a referir apenas aos videojogos...

Eu estou realmente fascinado com a Realidade Virtual. O nosso envolvimento começou há cerca de três anos atrás. No início sentimos que podia ser arriscado, apesar de todo o entusiasmo. Mas o nosso estúdio está habituado a inovação. Fizemos os primeiros jogos para a câmara da PlayStation. E os primeiros Singstar. Mesmo quando fizemos o primeiro Getaway, há cerca de 13 anos atrás, não havia loadings e nenhuma interface no ecrã...também foi uma inovação. Mas esta é a primeira vez que estou envolvido em algo que pode espalhar-se muito para além dos videojogos. Pode abranger outras formas de entretenimento, seja filmes ou televisão. Até há músicos a interessar-se bastante pelo VR. Podemos mesmo estar a falar de uma utilização empresarial, para comunicação business 2 business. Ou para vendas. Existe toda uma série de abordagens que acho que podem beneficiar da Realidade Virtual.

É claro que os jogos vão ser uma espécie de pioneiros. Afinal adoramos nova tecnologia. Mas não tenho dúvidas que existem muitas áreas que vão seguir o exemplo dos jogos.

PlayStation VR: "O subconsciente pode ser enganado na Realidade Virtual"PlayStation VR: "O subconsciente pode ser enganado na Realidade Virtual"PlayStation VR: "O subconsciente pode ser enganado na Realidade Virtual"
The Deep, London Heist e London Heist Getaway são as três demos presentes no Lisboa Games Week.

De que forma é que o PlayStation VR vai tornar-se uma parte integrante do ecosistema PlayStation? Existem planos para aumentar a experiência de um normal jogo PS4, ou mesmo para receber notificações através da consola? Ou estamos a falar de dois campos completamente diferenciados, mesmo que seja necessário ter a PS4 para funcionar?

Penso que o nosso presidente Shuhei Yoshida chegou a falar nisso no passado Paris Games Week. A nossa equipa do PlayStation VR está a trabalhar arduamente para perceber a melhor forma de integrar o headset no nosso ecosistema de software e plataformas. Honestamente não sou a melhor pessoa para falar disso porque gosto mais de estar dedicado a fazer jogos (risos).

Mas o que acho interessante, no que toca ao nosso ecosistema, é que temos cinco elementos chave. A PlayStation 4 que é a consola mais poderosa do mercado, o DualShock 4 que é um excelente comando, o Move igualmente, a câmara e agora o headset. Estes cinco elementos oferecem-nos um poder tremendo. Já fizemos experiências apenas com o headset, ou juntamente com o Move ou o DualShock. Existe um número enorme de oportunidades para explorar apenas com estes cinco elementos. Para um produtor de jogos é fantástico.

Se olharmos para uma consola doméstica como exemplo, sabemos que os primeiros jogos a sair comparados com os que são lançados depois quase que parecem para uma plataforma diferente. O mesmo vai acontecer com o VR. Estamos a aprender imenso e existem muitas melhorias que podemos fazer no pipeline de produção ou em termos de optimização. Obviamente que acho que estes primeiros jogos vão ser espantosos, mas é apenas o princípio do caminho. Existe mais para vir no futuro certamente.

De que forma é que o Social Screen vai permitir a um grupo de amigos ter experiências partilhadas com o PlayStation VR?

Existem alguns modos para o Social Screen. Um deles é bastante simples, na verdade. O que estamos a ver no headset é o que está a ser transmitido na TV. Pensámos muito acerca disso, porque queríamos permitir às pessoas verem o que se estava a passar no headset. Mas experimentámos vários protótipos. Num deles colocámos o nosso presidente Shuhei Yoshida numa casa assombrada virtual. Nós conseguimos ver onde ele estava e controlar o que o ia assustar (risos). Existem esse tipo de ideias, onde colocamos alguém numa sala, por exemplo, o os outros jogadores têm poder sobre o que acontece. E ainda existe o que chamamos de Custom Social Screen onde o que se vê é uma típica perspetiva de jogo. De repente passam a ter um oponente. É jogabilidade assimétrica. O Nic Doucet fez um simples jogo de gato-e-do-rato mas bastante engraçado, onde o jogador com o headset assume o papel de gato e os que têm o Dualshock são os ratos.

Mas existem vários outros tipos de coisas que se podem fazer. Um jogador pode controlar um helicóptero de combate enquanto outro é responsável pelas armas. Ou alguém numa base que comunica com outro jogador no exterior. Fizemos vários testes onde usámos um smartphone para comunicar com a pessoa que usava o headset. Na demo The Deep por exemplo, fizémos um protótipo onde um jogador estava no barco, capaz de ver o que se aproximava e avisar quem usava o headset. As opções são muitas. E ainda temos o multiplayer online, claro.

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Falou da jogabilidade assimétrica, que parecia um conceito promissor, assim como foi o controlo de movimentos e o 3D. Tudo foi catalogado como o "the next big thing" da indústria mas que nunca conseguiram suplantar o conceito tradicional dos videojogos. Tendo em conta que os dispositivos VR, incluindo o da PlayStation, podem significar um investimento avultado por parte dos consumidores, há receio que possa existir um ceticismo justificado? De que isto não é mais do que uma moda?

O que penso é isto. Provavelmente nem tudo o que mencionou, mas daqui a 10 ou 20 anos, vai-se olhar para o "motion gaming", o uso das câmaras e o 3D, como passos importantes para a realidade virtual. É verdade que nos últimos anos, essas tecnologias foram alvo de comentários de desconfiança. Mas acredito que daqui a alguns anos vão ser encaradas como ajudas preciosas para chegar à realidade virtual.

Se experimentar o VR com os comandos Move, passam a ter as vossas mãos no jogo. É algo bastante intuitivo como podemos ver na demo The London Heist. Acredito mesmo que tudo isso foram marcos importantes que nos levaram a chegar ao prémio maior que é a Realidade Virtual.

Quais as principais dificuldades e desafios no desenvolvimento de jogos específicos para a Realidade Virtual?

Isso tem sido um dos aspetos mais excitantes de todo este processo. Nos jogos mais tradicionais, estamos constantemente a tentar refinar e a melhorar mecânicas. Mas muito disso é o que apelidamos de "small eye innovation" que, sem dúvida, também nos ajuda a sermos melhores. Mas em relação ao VR, é como aterrar num planeta totalmente diferente (risos).

No que toca a desafios...temos coisas que esperamos que funcionem mas acabam por não funcionar. Coisas que não estávamos à espera de funcionar que afinal funcionam. Tivemos também de melhorar o nosso "pipeline" de produção para sermos realmente eficientes. Não podemos perder framerate, por exemplo, porque isso pode estragar a experiência. A própria forma como lidamos com as artes do jogo é diferente, porque é possível olhar para todo o lado.

Num jogo tradicional é como quando chegamos ao decor de um filme e ficamos surpreendidos como o cenário pode ser pequeno. Mas com o plano certo da câmara torna-se algo impressionante (risos). Num jogo VR deixamos de ter esse corredor. Estamos mesmo lá e podemos olhar para todo o lado. Se tivessemos os "assets" de um jogo normal, as portas iam parecer demasiado largas. Como nos velhos westerns que faziam as portas pequenas para o que o cowboy parecesse maior aos olhos do espectador (risos).

PlayStation VR: "O subconsciente pode ser enganado na Realidade Virtual"
Dave Ranyard, na área PlayStation do Lisboa Games Week.


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